Capela de São Sebastião no Tanque - 1988

História do Tanque e da capela de São Sebastião

Toponímia

No Tanque, há uma área de brejo conhecida por Caldeirão. No período chuvoso, um riacho perene transborda fazendo com que a água fique represada nos bojos de um lajedo. O local foi muito frequentado pelos moradores mais antigos que seguiam até o local para coletar água. Porém, a principal atividade no local era a lavagem roupas às bordas das cavidades rochosas cheias de água, eram os chamados “caldeirões”. Quando cheios, os caldeirões faziam daquele local uma grande lavanderia com seus “tanques” de lavar a céu aberto. A atividade era o ponto de encontro em que as mulheres trabalhavam e conversavam enquanto os filhos brincavam nos arredores. Dali provém à origem do nome do sítio e consequentemente, da povoação.

Os fundadores do Sítio Tanque

Em 1848, casaram-se Sebastião Joaquim Monteiro [*1820], natural da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição – Pedra-PE, e Generosa Maria Gomes [*1829], natural da Freguesia de São Félix de Buíque, no qual fixaram residência em propriedade rural desta freguesia e que originaria a povoação do Tanque. Sendo o sítio Tanque fundado pelo casal em junho de 1849.

Sebastião e Generosa tiveram oito filhos, sendo quatro homens e quatro mulheres. São eles: Luiz Monteiro dos Santos, Antônio Monteiro dos Santos, Manoel Monteiro dos Santos, [não identificado], Josefa Maria do Espírito Santo, Lourença Maria do Espírito Santo e outras duas [não identificadas].

O surto de cólera

Em 1862 a segunda epidemia de cólera morbo alcança Buíque, castigando principalmente as comunidades mais pobres da região. A falta de saneamento e a falta de orientação sobre cuidados para se evitar a doença, ampliavam potencialmente o desenvolvimento desta que chegou a causar muitas mortes na Freguesia, a ponto de a partir daí, surgirem vários cemitérios na região. Ao final de 1862, a doença avança pela ribeira, nas proximidades do Tanque. A população recorreu em penitência, às orações voltadas ao santo protetor contra as guerras e as pestes, o mártir São Sebastião. Suplicavam também a Nossa Senhora, noite e dia através de terços (rezas), rogando para que fossem mantidos a salvo da moléstia.

No ano seguinte, não havendo casos do surto entre os moradores do Tanque, resolveram se unirem para o cumprimento das promessas feitas em peleja ao santo. As pessoas mais influentes da época foram definidas como noiteiros (aqueles que contribuem financeiramente ou de outras formas para a realização de um festejo religioso) para a primeira novena dedicada à São Sebastião, consagrando o dia 20 de janeiro a ele. Não existia ainda a capela e o primeiro evento foi realizado na casa onde residiam Sebastião e Generosa.

Casa sede do Sítio Tanque - Buíque-PE
Antiga casa Sede do Sítio Tanque, constríida por Sebastião Joaquim Monteiro em junho de 1849.

A casa sede do Sítio Tanque

O imóvel sofreu algumas alterações, inclusive nos cômodos internos, preservando-se intacta a sala onde ocorreu o primeiro novenário do Tanque. No início da década de 1950 a 2017, foi propriedade de Hidelbrando Beserra de Andrade e Maria da Dores Freitas (dona Lica), ambos falecidos. Portas e janelas grandes em paredes grossas preservam um estilo de construção não mais usado e que dispensava uso de ferragens na estrutura à base de tijolos maciços. Está localizado na principal via de acesso para o povoado do Tanque.

A construção da capela de São Sebastião

A imagem do mártir São Sebastião foi obtida na década de 1850, pelo próprio Sebastião Joaquim Monteiro, que era devoto do santo. Em 1864, uma simples capela feita de taipa e telhas fora erguida em sua propriedade, sob o título de “Casa de oração”. A capela é a única em Buíque, construída com a face voltada para os fundos da povoação. Direção em que a doença se propagava no período do surto.

Na humilde capela, realizou-se o segundo novenário por diante. No final de 1868, o surto havia recuado e nos entornos daquela localidade, não houve sequer um caso de morte atrelado à doença.

O sino da capela foi comprado por Sebastião Monteiro, em sociedade com João Ferreira da Silva. Sebastião passou 20 anos à frente das ações da capela – sob título de casa de oração. Pouco antes de falecer recomendou ao filho mais velho: Luiz Monteiro dos Santos, que fosse o próximo cuidador da capela. Este deixou registros feitos a punho acerca das principais ocorrências realizadas na capela, o que permitiu no futuro, amplitude no levantamento de dados acerca da história do Tanque e sua capela.

Meu pai, em sua velhice, fez-me a recomendação seguinte, dizendo: Eu estou para morrer, tu tenhas cuidado na minha igrejinha. Em resposta disse eu: Nós faremos o que puder. Continuou meu pai:  Nós não, és tu! Vede-se as casas de oração (e nomeou as que haviam nas Ribeiras vizinhas, algumas das quais em mau estado) outra desbaratada, aquela em falta do velho; os filhos são muitos à espera de um e de outro, a igreja está caindo. E nada mais disse a respeito. Não me esqueci”. (SANTOS, Luiz Monteiro)

Sebastião cumpriu 11 novenários, falecendo aos 63 anos – 14 dias depois da missa de 20 de janeiro de 1883 – no dia 03 de fevereiro. No ano seguinte falece Generosa, em 28 de março, aos 55 anos. Ambos foram sepultados no interior da capela.

Vista para a capela do Tanque
Vista para a capela do Tanque | 2022

Em 06 de julho de 1884, Antônio Vital Bezerra, trouxe consigo a imagem de Santo Antônio para colocar no altar da capela. A imagem havia sido dada a ele, pelo próprio pai, Jacob Gore Bezerra. Das esmolas deixadas aos pés da estátua de Santo Antônio, empregou-se o apurado para a aquisição de um terreno na Serra, denominado “Cume da Boa Vista” – usado para o cultivo de fruteiras num quadro de 60 x 60 braças, comprado por duzentos réis.

Desde 1891, anualmente, no mês de outubro, em obediência à determinação do papa Pio XIII, os fiéis cumprem a reza do Santo Rosário. Mais tarde, reza-se a de São José, São Miguel Arcanjo e Nossa Senhora do Carmo. Aos domingos e segundas-feiras do mês de junho, reza-se a Santo Antônio.

Um novo regulamento estabelecido pela igreja Católica Apostólica Romana, permitia aos vigários e adjuntos, a realização de missas onde fosse possível. Porém, não eram permitidas celebrações de missas em estruturas particulares e sem licença.

Intervenção do padre João Ignacio de Albuquerque

O Padre João Ignacio de Albuquerque, foi um grande cooperador nas questões envolvendo a capela do Tanque, que avisou sobre a vinda do Cônego João Marques de Souza à Freguesia de Buíque, em visita pastoral realizada no ano de 1896, sugerindo aproveitar a ocasião para falar a respeito das necessidades da casa de oração do Tanque. A resposta obtida pelo reverendo foi a de que seria necessário a doação de um terreno para o patrimônio da capela e só assim a mesma poderia ser elevada a capela pública.

Luiz Monteiro dos Santos, regente da capela, seu irmão: Antônio Monteiro dos Santos [casado com Thereza Maria de Alexandria] e suas irmãs: Josefa Maria do Espírito Santo e Lourença Maria do Espírito Santo [casada com Cândido José da Silva], foram os doadores do patrimônio em terras, que incluía capela. Fato que ocorrera 13 anos após o falecimento do fundador e 12 de sua esposa. Tendo como base a porta principal da capela, foram medidas 100 braças ao norte e 50 ao sul. Os papéis da doação foram autorizados pelo vigário vigente e emitidos em maio de 1896, quando da visita pastoral do Cônego João Marques de Souza, havendo disso cumpridas todas as formalidades legais exigidas pelo visitante.

Benção da capela

Tendo conhecimento de que a capela não havia sido abençoada, Luiz Monteiro dos Santos, irmãos, irmãs e cunhados, suplicaram a autorização ao prelado de Olinda, para que pudesse o pároco da Freguesia de Buíque, benzer a capela do Tanque.

A condição estabelecida pelo Bispo de Olinda para a benção da capela, era assegurar-se do compromisso de Luiz Monteiro dos Santos com a capela, fazendo assim, com que este assinasse documento firmado em 2 de dezembro de 1898, constando que o mesmo seria responsável pela reconstrução da capela. Criando nova estrutura feita com tijolos, no lugar da antiga feita em taipa.

A capela, na época da doação, encontrava-se fechada, com piso ladrilhado, paredes pintadas e um altar feito em madeira. A mercê foi obtida, obrigando Luiz Monteiro dos Santos a se responsabilizar pelo imóvel. Logo, o pároco João Ignacio de Albuquerque, estabeleceu dia e hora para a realização da celebração.

Diante do vigário João Ignacio, muitos fieis estiveram presentes, inclusive cidadãos ilustres como o Cel. Manoel Ferreira Ferro, o capitão Joaquim Epifânio de Melo, o capitão Manoel Honório de Sampaio, dona Amélia Maria da Conceição, dona Angélica Maria de Alexandria, dona Jose e Maria dos Espírito Santo.

O vigário João Ignacio, contribuiu com a compra de algumas peças necessária para o funcionamento da capela; o cálice fora doado por Dona Josefa Maria do Espírito; pessoas de alma caridosa ofertaram os demais paramentos.

O surto de febre tifóide

É comum que as igrejas se voltem para o centro duma comunidade ou tenham a face voltada para o lado Leste (nascente). A capela que substituiu a antiga feita em taipa, foi construída com a frente virada para o sentido oposto da povoação. O motivo resulta de um surto de febre tifoide (doença causada pela bactéria salmonela – transmitida através da água ou alimentos contaminados), ocorrido em 1908. O surto teve seu maior número de vítimas na região do Sítio Cavalo. A comunidade assustada prostrou-se em orações, clamando proteção ao mártir e novamente não foram atingidos por outra doença.

Capela do Tanque - 2022
Capela do Tanque | 2022

Reconstrução da capela

Luiz Monteiro enfrentava dificuldades para a reconstrução da capela. Não haviam reservas próprias suficientes para tal feito. Por isso, consultou o vigário João Ignácio de Albuquerque. Convidou o pedreiro Manoel Monteiro dos Santos, seu irmão, para a edificação. Cuja demolição da antiga capela iniciou-se o dia 3 de outubro de 1910. Três meses depois, em 11 de janeiro de 1911, a capela encontrava-se com a estrutura fechada a tijolos, pintada e ladrilhada. No interior, um altar com estrado de madeira na largura da capela, um confessionário em madeira com assento feito em palha, um armário, uma cadeira e quatro bancos de madeira.

Com exceção do armário e os quatro bancos, todo resto da obra fora feita por Manoel Monteiro dos Santos [+ 07.03.1934]. Residia em Moderna, nas proximidades do Riacho do mel, em Alagoa de Baixo (atual Sertânia) e veio para a construção da capela, trazendo consigo, seus 3 filhos menores: João, Thomas e Sebastião – que se prestaram como serventes aprendizes. Boa parte do pagamento, que não era muito, foi devolvida pelo mestre de obras, em sinal de oferta para a capela.

Humanamente parecia impossível. Dados os primeiros passos na obra de São Sebastião, não faltou gente para o trabalho, não faltou material ao pé da obra, esmolas de toda casta, nem alimento para quem quisesse se servir”. (SANTOS, Luiz Monteiro)

A obra fora iniciada em 03 de outubro de 1910, findando no dia 11 de janeiro de 1911. No dia 18 próximo (oitavo dia da novena), foi celebrada a missa inaugural pelo vigário João Ignacio de Albuquerque, sendo a nova capela foi muito elogiada pelos fiéis.

Entre 1812 e 1814, os nichos dos santos foram fechados com vidro e adquiriu-se mais fazendas e flores para adorno. No mesmo período, chegara na Freguesia, o Apostolado do Santíssimo Coração de Jesus. O vigário João Ignácio e Albuquerque, lançou convite aos servos para se associarem ao Apostolado. Falecera em 15 de agosto de 1915, deixando um legado de mais de 30 anos prestando serviços às comunidades das Freguesias de Buique, Gameleira e Pedra.

Mantimento

Além das esmolas depositadas aos pés da imagem de São Sebastião e Santo Antônio, entre 1890 e 1891, parte das ofertas obtidas foi utilizada para a aquisição de 3 cabras, custeadas por 5 mil réis.

Ditas cabras produziram, não falando de alguns prejuízos que houve, e despesas, como se vê em notas, de gado vacum, jumentos havidos por troca da produção de 3 criações, compradas por cinco mil réis, contadas em moedas de 40 réis, 20 réis e 10 réis deixados por esmola aos fiéis de São Sebastião. Hoje 22 de fevereiro de 1937, ainda existem jumentos e criações”. (SANTOS, Luiz Monteiro)

Os animais procriaram e trouxeram ganhos. Com o passar do tempo, a criação se estendia para novas cabras, gado vacum e muar. Quando da reconstrução da capela. Parte dos animais foram vendidos para ajudar nas despesas.

Em 1919, o pároco Antônio José da Costa Rego, dotou à capela de São Sebastião através da Associação do subcentro do Apostolado do Sagrado Coração de Jesus – fundada em 17 de maio do referido ano. No qual fizeram parte: Luiz Monteiro dos Santos – presidente, dona Maria Josefa do Espírito Santo – tesoureira, Euclides Elirio Ferreira de Miranda – secretário, Antônio Vital Bezerra – zelador, dona Thereza Maria Ramos – zeladora. Na época haviam 99 associados. Antônio José permaneceu por 4 anos, deixando a paróquia em 1922.

No mesmo intervalo de tempo, fora instalada a congregação da doutrina Cristã, a cargo do zelador padre Antônio Costa. Sendo nomeado catequista: o tenente Manoel Monteiro dos Santos. E também, a devoção das almas do purgatório sob o patrocínio de São Miguel Arcanjo, para uso dos fiéis da Freguesia de São Félix de Buique.

Devoção das almas do purgatório sob o patrocínio de São Miguel Arcanjo

Transcrição da Ata da primeira reunião

Em virtude da portaria e regulamento da Dioceses de Pesqueira, o dia 24 de fevereiro de 1912, Sua Rev. Excelentíssimo Cônego Antônio José da Costa Rego, instituiu a devoção das almas do purgatório, sob patrocínio de São Miguel Arcanjo, para uso de seus fieis paroquianos da Freguesia de Buique, com sede na capela de São Sebastião, no povoado São Sebastião. Sendo a referida capela o primeiro centro da Freguesia de São Félix, relativo à devoção das almas do purgatório. Sua excelentíssima Rev. o Cônego Antônio José da Costa Rego, entregou a caixa destinada para as esmolas ao zelador do Apostolado da Oração do Coração de Jesus, Manoel Monteiro dos Santos, este recomendado para fazer alistar-se o povo na Associação das Almas do Purgatório. Nada mais tendo a fazer, digo, tendo a tratar, fez suplicar ao Sagrado Coração de Jesus para que concedesse feliz resultado da Associação. Eu Luiz Monteiro dos Santos, secretário [termo ilegível], aos 24 de fevereiro de 1921, no povoado São Sebastião.

Falecimento de Luiz Monteiro dos Santos

Luiz Monteiro dos Santos, tendo cumprido a missão confiada por seu pai, faleceu no dia 25 de janeiro de 1939. Deixou a capela com reparos a serem feitos. O padre Luiz Sampaio incentivou a população a prestar ajuda, em pouco tempo mudou para outra localidade. Em seu lugar veio o padre Givaldo Prinz que continuou a incentivar a população, pedindo ajuda em dinheiro ou em prestação de serviços voluntários.

“E todo o tempo dos trabalhos de pedras e tijolos para a construção da capela, foram carregadas pelo povo à noite depois do Terço. E alunos da escola”.

Reforma no altar da capela de São Sebastião

Em 1958, o Padre José Kerhle, juntamente com o cidadão Estevam Pereira da Silva, seguiu em campanha com a imagem de São Félix, visitando fazendas e casas populares, pedindo contribuições para a remodelagem do altar principal e a criação de mais dois altares na capela do Tanque, além de uma pia batismal. Todos foram concluídos em setembro daquele ano por um cidadão chamado Joventino.

O novenário e a tradicional festa de São Sebastião do Tanque

O novenário, desde primeira data, permanece sendo realizado na noite do dia 11 de janeiro, seguindo até o dia 19, com missa realizada no dia 20. E por longa data manteve grande público de fieis. Com o passar do tempo, os novenários tiveram diminuição de público que o frequenta pela fé. A festividade litúrgica é o evento mais aguardado na Vila. E representa a maior culminância do comércio local. O último dia reúne grande quantidade de pessoas, após o culto, ocorre uma grande festa com apresentações de bandas musicais de temática não religiosa.

Os mais jovens são os maiores apreciadores da festa. Os estilos musicais acompanham músicas e ritmos da moda, definidos pela preferência do público jovem, que de modo geral adota preferência por forró, sertanejo, brega ou algo semelhante. A festa tem o apoio da prefeitura e apesar de ser associada ao novenário, não é parte do evento religioso. Mas, uma manifestação cultural vinculada ao evento com o passar dos anos.

O evento atrai públicos locais, de cidades e distritos vizinhos. Atraindo também antigos moradores, residentes em outros Estados e da Capital pernambucana.


Referências:

  • Luiz Monteiro dos; SANTOS. Manoel Bezerra; NASCIMENTO, José Bezerra. Caderno de registros de ocorrências da capela de São Sebastião do Tanque. s/d. Arquivo do acervo da Matriz de São Félix de Cantalice. Buíque-PE.
  • Entrevista concedida pelo Pe. Antônio Ferreira em 18 jan 2021.
  • https://www.familysearch.org, Óbitos 1880, Abr-1885, maio p.1-53.
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Publicitário, fotógrafo e pesquisador da história buiquense.

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