Candeeiro

Candeeiro – o penúltimo cangaceiro

Na última investida contra o mais forte grupo de cangaceiros da história do sertão, ocorrida na madrugada de 28 de julho de 1938, na Grota (Vale) do Angico em Poço Redondo, Sergipe – às margens do Rio São Francisco, divisa com Piranhas – Alagoas. Findava-se o auge do cangaço com a morte de Maria Bonita, Lampião, outros nove cangaceiros e o soldado Adrião Pedro. Entre aqueles que conseguiram escapar, estava Manoel Dantas Loyola, vulgo “Candeeiro”. Nascido em 06 de outubro de 1914, na fazenda Lagoa do Curral – distrito de Guanumby, Buíque-PE. O filho de José Bezerra dos Santos e Eliza Dantas Badega. O apelido foi dado por Virgínio – outro cangaceiro de Lampião.

Candeeiro era o caçador do grupo e um dos principais assessores do bando. A ele era incumbida a missão de entregar as cartas escritas por Lampião, encaminhadas à comerciantes e grandes fazendeiros da época, no qual exigia dinheiro – o pedido era sempre atendido; escapou da emboscada porque havia ido buscar água, estava nas proximidades preparando-se para urinar, quando começou o tiroteio – evadiu-se a tempo e ainda assim, foi atingido por uma bala no braço. Candeeiro passou quatro meses na caatinga. Sob a promessa de que não seria morto, entregou-se ainda com o braço na tipoia na cidade de Jeremoabo, Bahia. Cumpriu dois anos de prisão junto com outros 16 cangaceiros.

Sua entrada no grupo ocorreu por acaso – quase dois anos antes da morte de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. A fazenda em que trabalhava, em Alagoas, fora invadida por cangaceiros e para não morrer, optou por acompanhar o grupo. Todos os cangaceiros do bando eram tratados por apelidos e ninguém sabia o nome de ninguém. Assim faziam para proteger a própria identidade e confundir os inimigos, subintendendo a invencibilidade do bando que aparentemente não tinha baixas durante os confrontos.

No final daquele período, Lampião via no rádio um instrumento preocupante. Um indicativo veloz sobre o paradeiro do bando que favorecia a polícia. Lampião planejava seguir para Minas Gerais. Contudo, teria a difícil tarefa de atravessar a Bahia, onde era ameaçado de morte. Na madrugada de 28 de julho de 1938, o cabo Panta de 26 anos que fazia parte da volante (policiamento) que matou lampião, foi o responsável pelo tiro que acertou Maria bonita. Adiante, encontrou Lampião caído e antecipou sua morte, atirando contra a cabeça. O volante e ex-cangaceiro “Santo”, disse: “Não esbagace a cabeça dele porque esse é Lampião!”.

Após o término do cangaço, candeeiro foi morar de Guanumby (distrito de Buíque-PE). Era proprietário duma bodega. Seu Né, como era chamado, tinha o costume de passar parte do tempo numa cadeira de balanço na porta de casa. Usava sempre camisa de manga comprida para cobrir a cicatriz no braço direito em decorrência do tiro tomado durante a fuga do último cerco contra o bando. Tinha outra cicatriz na coxa direita, decorrente de um tiro em combate contra os “macacos do governo” na Serrinha de Garanhuns-PE. O ferimento teria sido tratado com fumo, água de casca de aroeira e farinha de mandioca. Era um homem pacato e por trás de um olhar pacato guardavam-se as memórias de um dos últimos cangaceiros.

Em dezembro de 2009 houve uma noite de poesias dedicada a seu Né. Lá estavam presentes aboiadores, declamadores, emboladores e amigos para desejar-lhe feliz aniversário. Três anos depois, o programa Fantástico da Rede Globo, promoveu um encontro inusitado entre Manoel Dantas e José Panta Loiola (o Cabo Panta que matou Maria Bonita). O local do encontro foi nas proximidades da hidrelétrica de Xingó – divisa de Alagoas com Bahia e Sergipe. Eles apertaram as mãos demonstrando não haver qualquer mágoa sobre o período em que estiveram em lados opostos.

Manoel era devoto de Padre Cícero do Juazeiro, faleceu na quarta-feira de 24 de julho de 2013, aos 98 anos no Hospital Memorial Arcoverde de complicações respiratórias, após sofrer dias antes, um acidente vascular cerebral (AVC). Foi sepultado no cemitério de Buíque-PE. Foi o penúltimo dos ex-cangaceiros sobreviventes do cerco de Angicos a morrer. Sendo o último: José Alves de Matos, cuja alcunha era “25”, este falecido em 16 de junho de 2014 em Maceió-AL.

Sobre término daquele período pode-se dizer que as forças do temido bando encouraçado não foram minadas pelo cerco em Angicos. Havia algo maior; algo que andava assombrando a mente de Lampião e seus seguidores naqueles últimos dias. O cangaço perdeu para uma poderosa invenção – o rádio.


Referências:

  • ALMEIDA, Paulo Tarciso Freire. As janelas do sobrado. Usina de letras. p.324. 2011.
  • MEDEIROS, Carlos Rostand França de. A morte do cangaceiro que conheci. Tok de História. Disponível em: https://tokdehistoria.com.br/tag/morreu-o-ex-cangaceiro-candeeiro/. Acessado em 08/03/2018.
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Publicitário, fotógrafo e pesquisador da história buiquense.

2 Comentários

  1. Foram grandes batalhas na vida de lampião, então a morte de lampião foi junto com Maria bonita! Não tinha lido sobre as mortes, em qual circunstâncias e a data exata. Não sabia q o rádio teria sido uns dos seus maiores adversários. Muito bem informado sobre os dois últimos cangaceiros e o fim do cangaço.

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